domingo, 30 de setembro de 2012

Contextualização do "Impasse"

O Documentário Impasse retrata o processo de mobilização de 2010, entretanto, ele é fruto de uma continuidade de lutas pelo transporte público em Florianópolis. Segue abaixo o vídeo "Amanhã será maior" que retrata a Revolta da Catraca de 2004-2005 e a Carta de Princípios do MPL - Movimento pelo Passe Livre que influenciou no modo de organização e ação dessa pauta.


[Carta de princípios do Movimento Passe Livre
28 de janeiro de 2005
Alterada no 3º Encontro Nacional do Movimento Passe Livre, no dia 30 de julho de 2007
Princípios organizativos do Movimento Passe Livre Nacional
O Movimento Passe Livre é um movimento horizontal, autônomo, independente e apartidário, mas não antipartidário. A independência do MPL se faz não somente em relação a partidos, mas também a ONGs, instituições religiosas, financeiras etc.
Nossa disposição é de Frente Única, mas com os setores reconhecidamente dispostos à luta pelo Passe-Livre estudantil e pelas nossas perspectivas estratégicas. Os documentos assinados pelo Movimento devem conter o nome Movimento Passe Livre, evitando, assim, as disputas de projeção de partidos, entidades e organizações.
A via parlamentar não deve ser o sustentáculo do MPL, ao contrário, a força deve vir das ruas.
Os princípios constitutivos do MPL serão definidos somente pelo método do consenso. Nas deliberações não referentes a princípios, deve-se buscar propostas consensuais, na impossibilidade, deve-se ter previsto o recurso à votação.
Perspectivas Estratégicas
O MPL não tem fim em si mesmo, deve ser um meio para a construção de uma outra sociedade. Da mesma forma, a luta pelo passe-livre estudantil não tem um fim em si mesma. Ela é o instrumento inicial de debate sobre a transformação da atual concepção de transporte coletivo urbano, rechaçando a concepção mercadológica de transporte e abrindo a luta por um transporte público, gratuito e de qualidade, como direito para o conjunto da sociedade; por um transporte coletivo fora da iniciativa privada, sob controle público (dos trabalhadores e usuários).
O MPL deve ter como perspectiva a mobilização dos jovens e trabalhadores pela expropriação do transporte coletivo, retirando-o da iniciativa privada, sem indenização, colocando-o sob o controle dos trabalhadores e da população. Assim, deve-se construir o MPL com reivindicações que ultrapassem os limites do capitalismo, vindo a se somar a movimentos revolucionários que contestam a ordem vigente. Portanto, deve-se participar de espaços que possibilitem a articulação com outros movimentos, sempre analisando o que é possível fazer de acordo com a conjuntura local.
Os projetos reivindicados para a implementação do passe livre para uma categoria não devem implicar em aumento das tarifas para os demais usuários.
O MPL deve fomentar a discussão sobre aspectos urbanos como crescimento desordenado das metrópoles, relação cidade e meio ambiente, especulação imobiliária e a relação entre drogas, violência e desigualdade social.
O MPL deve lutar pela defesa da liberdade de manifestação, contra a repressão e criminalização dos movimentos sociais. Nesse sentido, lutar contra a própria repressão e criminalização de que tem sido alvo.
Organização e constituição
O apoio mútuo deve ser a base que garante a existência do movimento em nível movimento nacional.
O MPL se constitui através de um pacto federativo, isto é, uma aliança em que as partes obrigam-se recíproca e igualmente e na qual os movimentos nas cidades mantêm a sua autonomia diante do movimento em nível federal, ou seja, um pacto no qual é respeitada a autonomia local de organização.
As unidades locais devem seguir os princípios federais do movimento. Ressalta-se que o princípio da Frente Única deve ser respeitado, estando acima de questões ideológicas.
O MPL em nível federal é formado por representantes dos movimentos nas cidades, que constituem um Grupo de Trabalho (GT). O GT é formado por pelo menos 1 e no máximo 3 membros referendados pelas delegações presentes no Encontro. Os grupos locais de luta não presentes devem ter o aval dos movimentos que fizerem parte do GT. Deve-se garantir a rotatividade dentro do GT de acordo com as decisões do MPL local.
Semana Nacional de Luta pelo Passe Livre
A semana do dia 26 de outubro fica definida como Semana Nacional de Luta pelo Passe-Livre. Preferencialmente, as mobilizações devem ocorrer no dia 26 de outubro, e se possível no mesmo horário. Os MPLs locais devem ter autonomia para definir as atividades a serem realizadas. O GT deve procurar obter a programação de todas as cidades para divulgar por meios eletrônicos e outros.
Outras resoluções
- O MPL deve utilizar mídias alternativas para a divulgação de ações e fomentar a criação e expansão destes meios. Já o contato com a mídia corporativa deve ser cauteloso, entendendo que estes meios estão diretamente atrelados às oligarquias do transporte e do Poder Público.
- O MPL se coloca contra todo tipo de preconceito (racial, sexual, gênero etc.).]

terça-feira, 25 de setembro de 2012

sexta-feira, 7 de setembro de 2012

Entrevista: Eloisa e o Movimento Pinguim Chileno

A jovem de 17 anos, Eloísa González, é um dos rostos mais visíveis dos “pinguins”, como são chamados os alunos secundaristas. Ela afirma, na entrevista abaixo, que o governo de Piñera aposta no desgaste e na divisão do movimento estudantil.

A reportagem é de Christian Palma e está publicada no jornal argentino Página/12, 27-08-2012. A tradução é do Cepat.

Em 08 de agosto passado, quando no meio de uma das tantas marchas protagonizadas pelos estudantes entre 2011 e 2012 foram queimados três micro-ônibus em Santiago, a jovem de 17 anos e porta-voz da Assembleia de Estudantes Secundaristas (Aces), Eloísa González, sua voz não tremeu para acusar o governo de Sebastián Piñera de tentar criminalizar o movimento estudantil. O fez diante das câmaras de TV de cobertura nacional. Depois moderou suas palavras, mas deu conta do caráter da nova cara visível dos pinguins, o que, de passagem, incendiou outra vez a causa estudantil chilena, como reconhecem todos os atores.

Eloísa claramente acendeu as alarmas nos escritórios das autoridades, que viam como mesmo com o passar do tempo as mobilizações não permaneciam paradas. Inclusive o prefeito de Santiago, Pablo Zalaquett, a qualificou de “uma das lideranças mais negativas que viu nos últimos tempos”, acusando-a de incentivar a violência. Ela, contudo, segue dando a cara, como no sábado – depois que as forças policiais dissolveram um encontro de secundaristas –, quando declarou que “a violência traz mais violência e na democracia não é a forma de se expressar. Não devemos nos fazer de vítimas caso nos provoquem”.

Com essa franqueza, a moça de cabelos ruivos, que vive sozinha com sua mãe professora, quer estudar literatura ou economia e reconhece abertamente sua condição de lésbica, conversou com o Página/12 fora da casa central da Federação de Estudantes da Universidade do Chile, onde temas como a educação gratuita e de qualidade, o fim do lucro e o retorno da educação pública ao governo central se misturam com os ideais da nova líder.

Você lidera a Aces, a ala mais radical dos secundaristas. Como é o trabalho diário na assembleia?
No movimento estudantil secundarista historicamente existiram várias organizações principais, uma que acredita num modelo federativo e outra no modelo de assembleias que permite fazer melhor as tarefas e que conta com a participação de estudantes de base, que é onde eu participo. Aqui todos trabalham por igual, quem fala nos meios de comunicação também sai para “machetear” (pedir na rua) dinheiro, fazer faixas para as assembleias. Todo o mundo tem tarefas, incluindo-me a mim. Cada semana participam em média 50 liceus.

A Aces é mais combativa, então. Convoca os colégios periféricos?
A assembleia representa colégios mais periféricos que não estiveram em outras organizações. Quanto à questão da combatividade, nos definimos como uma assembleia analítica, mas ao mesmo tempo de ação, ou seja, combinamos mais coisas; as mobilizações nos permitem gerar propostas, mas também reforçar as mobilizações.

Na ocasião em que foram queimados três micro-ônibus o governo veio com tudo para cima de você. Como toma essas críticas?
A responsabilidade não é nossa. Nós marchamos, nós ocupamos os colégios e explicamos as nossas demandas, que têm a ver com a crua realidade em que estamos vivendo como secundaristas. Acreditamos que a violência fundamental é a que se dá no dia a dia no interior dos estabelecimentos, isto não aconteceria se o governo nos desse uma solução imediata para o conflito.

Mas se individualizou em você?
Foi um ataque direto à minha pessoa, mas como eu represento uma assembleia, deixamos claro que respondo pelo que se decide em conjunto e a melhor ferramenta que temos para descartar as acusações contra mim é que eu represento um amplo movimento de secundaristas.

Concorda em que vocês deram um novo impulso ao movimento este ano?
Sim, efetivamente, mas os secundaristas historicamente foram da linha de frente e levantaram os movimentos estudantis porque nunca houve uma resposta concreta às nossas demandas, nem um mínimo avanço, mas antes o aprofundamento e a imposição da agenda privatizadora do governo.

Desde quando não conversam com o governo?
Ufff, desde o ano passado buscamos respostas que nunca chegaram.

O governo aposta no desgaste?
O Executivo aposta no desgaste e na divisão, e critica o movimento estudantil com políticas que buscam baixar o perfil.

Que avaliação fazem do ministro da Educação, Harald Beyer?
É de uma linha muito mais dura que os dois ministros anteriores, muito mais fechado ao diálogo e mais reacionário às nossas demandas e isso faz mal a ele e à sua gestão. Deve entender que aqui houve dois ministros que já foram substituídos e, diante disso, deveria hoje preocupar-se com a situação em que nos encontramos.

O movimento se radicalizou?
No twitter se diz que o ministro não passa de agosto (ri). Ele deveria se preocupar com as mobilizações e tratar de dar respostas logo, porque se as mobilizações aumentarem as coisas ficarão difíceis para ele.

Foi uma falha não se coordenar melhor no ano passado com os universitários?
Sim. Em 2011 não nos consideraram tanto. Isto aparecia como uma política dos universitários. Este ano nos validaram com a coordenação das marchas.
Errou neste sentido a gestão de Camila Vallejo.
Não apenas a gestão dela, mas a de todos os líderes universitários. Este ano houve uma mudança de dirigentes e uma mudança de política deles.

O que virá para os próximos dias?
No dia 28 [ontem] nos somamos à greve de secundarista, universitários e professores e virão mais ocupações de liceus na periferia.

Sua luta apontará para as reivindicações das minorias?
Dependerá de onde estiver. Agora a minha luta é pelos secundaristas, serei universitária e o farei a partir dali. Mas está ligado ao fato de que aqui estamos lutando pelos direitos fundamentais do povo e dizendo não à discriminação em todo sentido. Não tenho líderes espelho. Nem gosto de nenhum político ou partido. Não vou votar nas eleições municipais porque não vejo as eleições como um mecanismo que acredita em mudanças de verdade. Também não voto nas eleições presidenciais. Não simpatizo com nenhum candidato, não creio no critério do mal menor, os movimentos sociais devem propor o que querem para produzir mudanças.

FONTE: http://www.ihu.unisinos.br/noticias/512913-eloisa-uma-lider-pinguim